A sina de pessoas expostas à falta de
saneamento e, por consequência, à esquistossomose, é cruel quando não se
consegue vencer efeitos do verme no organismo. Nas cidades em que o Programa de
Enfrentamento das Doenças Negligenciadas da Secretaria Estadual de Saúde
encontrou elevada transmissão e precária cobertura de água tratada e rede de
esgoto, muitos são os sequelados. Chamam a atenção crianças e adolescentes com
doença grave, um indicador da atualidade do problema.
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Rio Capibaribe Mirim, próximo ao Matadouro Público, Timbaúba |
Os irmãos Maria do Bom Despacho da Silva, 46 anos,
e José Severino, 60, desde a infância sempre tomaram banho de rio. Os
preferidos eram o Tracunhaém e o Ribeiro, que passavam perto da casa deles, na
zona rural de Aliança, município da Mata Norte, a 90 quilômetros do Recife. O
que os dois não sabiam é que esse hábito tão aparentemente inofensivo e
prazeroso iria mudar o rumo da vida deles quando a maturidade surgisse. Aos 42
anos, ela ficou paralítica e ele, a partir de 2012, passou a sofrer com
hemorragias digestivas. Cada um tem um tipo de manifestação da esquistossomose,
a doença negligenciada por décadas pelas políticas de saneamento e saúde.
Em Timbaúba, município vizinho de Aliança, também
na zona canavieira, uma das vítimas da paralisia tem apenas 17 anos. O
estudante Edvan Silva, morador do Centro da cidade, provavelmente foi infectado
ao dar banho no cavalo de estimação, no Rio Capibaribe Mirim, que corta o município e
é considerado outra fonte-d’água contaminada. “Ele adoeceu aos 14 anos.
Começou
com uma dor na coluna numa sexta-feira e não conseguiu se levantar mais no
domingo. Tinha perdido as forças das pernas”, conta a dona de casa Maria
Cláudia da Silva, mãe do garoto. Edvan passou 30 dias internado no setor de
Neuropediatria do Hospital da Restauração, no Recife, que diagnosticou a
doença. Passou um ano em cadeira de rodas e vem recuperando gradativamente os
movimentos, após tratamento medicamentoso e fisioterapia. “É muito ruim ficar
assim”, diz o estudante, com lágrimas nos olhos. A doença atrapalhou os estudos
e o seu principal lazer, que é andar a cavalo. A fisioterapia deixou de ser
intensiva por causa da dificuldade de deslocamento ao Recife.
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Rio Capibaribe Mirim, Timbaúba |
Mortes -
Por ano, em Pernambuco, morrem mais de 200 pessoas vítimas da esquistossomose.
Nesse número, não estão incluídas aquelas em que a doença é considerada causa
secundária. Essa frequência é a mais alta do País, pois aqui se registra um
terço de todos os óbitos brasileiros causados pelo xistossomo.
Uma das últimas vítimas foi Antônio Seabra da Paixão, 65 anos, natural de
Timbaúba, área de transmissão permanente.
Ele faleceu no dia 15 de março
último, com hemorragia digestiva e choque hemorrágico, na UPA de São Lourenço
da Mata, cidade onde residia. Foi vítima da doença e da assistência fragilizada
da rede SUS, em que pacientes graves não conseguem transferência imediata para
hospitais especializados nem são devidamente monitorados em ambulatórios de
referência.
Antônio tomou banho de rio na juventude e só há três anos, num primeiro
episódio de hemorragia digestiva, havia descoberto a esquistossomose. Na época,
após atendimento emergencial no Hospital da Restauração, passou três meses
recebendo tratamento no Hospital Oswaldo Cruz, mas de lá recebeu alta e não
vinha tendo mais nenhum acompanhamento.
As cinco
localidades com maior proporção de pessoas infestadas pelos vermes estão em São
Benedito do Sul, Escada (Mata Sul), Ipojuca (Região Metropolitana) e Vicência
(Mata Norte). Aliança, Timbaúba (Mata Norte), Bom Conselho (Agreste)
e Ipojuca também são as cidades com o maior número de comunidades atingidas.
Trecho da matéria publicada pelo Jornal do Commercio
Texto: Verônica Almeida
Fotos: Bobby Fabisak