sábado, 19 de maio de 2012

Após 12 anos de poder no Recife, rachado, PT define rumos em sua maior encruzilhada em Pernambuco



Fragmentado, depois de 12 anos no comando da Prefeitura da Cidade do Recife, o Partido dos Trabalhadores (PT) realiza suas prévias neste domingo, depois de dois meses de muita polêmica interna, com direito a agressões mútuas entre os seus principais caciques da legenda na capital. A prévia paralisou por dois meses a sucessão municipal, engessando todos os partidos, até os de oposição, que ficaram à espera de uma definição do nome petista. O grande risco para o PT é ter que deixar o Palácio do Capibaribe, ocupado pela legenda desde janeiro de 2001.

O prefeito do Recife, João da Costa (PT) busca o direito à reeleição, mesmo com altos índices de rejeição nas pesquisas. Indicado para a disputa do cargo de prefeito pelo ex-prefeito e atual deputado federal João Paulo (PT), João da Costa consagrou-se em 2008, mesmo tendo sua candidatura apontada pelo próprio partido como uma invenção do então aliado, até aquele momento seu padrinho político. Após três anos turbulentos, o prefeito chega ao ano eleitoral rompido com o antecessor por motivos que até hoje são desconhecidos. Não bastasse, ficou fora de combate por quatro meses devido a um transplante de rim.

Do outro lado da disputa está o deputado federal Maurício Rands, ex-líder do governo Lula, que representa a corrente Construindo um Novo Brasil (CNB), do senador Humberto Costa, e defende a troca do gestor ante o temor de derrota iminente nas eleições de outubro. Na campanha, Rands chamou Costa diversas vezes de lerdo e concentrador, defendendo sempre a tese de que os recifenses gostariam de trocar 'o maquinista', mas continuar com o trem petista em movimento.
Na disputa, João da Costa de fato acabou apartando-se das lideranças históricas do partido, que também passam por um teste nas urnas neste domingo. Os aliados do prefeito batem na tecla de que trata-se de uma disputa entre a base, que votaria em João da Costa, e a cúpula do partido.

A CNB é majoritária no partido, saiu vitoriosa do último Processo de Eleição Direta (PED), em 2009, mas viu as correntes que a levaram ao comando se partirem. Um das baixas foi o ex-presidente estadual do partido Jorge Perez, que uniu-se à deputada estadual Teresa Leitão para formar uma nova corrente, o coletivo PT Militante. A deputada já vinha num processo de afastamento dos líderes da CNB e rompeu de vez quando os caciques petistas frustraram sua tentativa de lançar-se à Prefeitura de Olinda, optando pelo apoio à reeleição de Renildo Calheiros (PCdoB).

Também integrante da CNB, o deputado estadual André Campos viu-se diante de uma saia-justa quando os colegas da tendência decidiram pelo lançamento da candidatura de Rands à prévia. Na cadeira de secretário municipal de Turismo e de Governo, ele também deixou a CNB.

Nesta semana que passou, os debates internos voltaram a ficar acalorados. Oprefeito João da Costa cobrou respeito ao resultado da votação interna e o ex-prefeito João Paulo avisou que não subiria no palanque do correligionário de jeito algum. Na tréplica, João da Costa o acusou de não ser democrático e não respeitar a vontade dos militantes.
A votação interna começa às 9h e termina às 17h. Cerca de 24,5 mil militantes estão aptos a votar. O resultado do pleito deve ser conhecido no início da noite. Os grupos do secretário estadual de Governo Maurício Rands e do prefeito João da Costa apostam na mobilização dos militantes como a maior arma para vencer as prévias petistas pela indicação do partido na sucessão do Recife.
João da Costa e Maurício Rands votarão no mesmo local, na Escola Divino Espírito Santo, na Várzea, Zona Oeste da cidade. Por isso, um acordo de cavalheiros foi estabelecido para evitar o encontro. O deputado federal votará pela manhã e João da Costa, às 14h. O senador Humberto Costa e o ex-prefeito João Paulo também compartilham o mesmo local de votação. Por volta das 9h, irão à Escola Estadual Sizenando da Silveira para votar.

O prefeito aguardará a contagem dos votos na sede da Executiva municipal, junto com as lideranças que o apoiam. Já Rands assistirá a apuração no diretório estadual, ao lado do senador Humberto Costa. O deputado João Paulo não estará presente, uma vez que marcou uma viagem para a África do Sul, em missão do Congresso Nacional

Com o resultado das urnas, começa de fato a disputa sucessória no Recife, uma vez que oposição e aliados dos petistas ficaram assistindo às escaramuças. 

Papel do governador Eduardo Campos

Oficialmente, o governador Eduardo Campos, do PSB, preferiu não envolver-se na disputa, aguardando a indicação oficial do PT para fechar as alianças com vista ao pleito de outubro. Nos bastidores, os aliados do prefeito acreditam em patrocínio dos socialistas, mesmo que discreto. Há cerca de um mês, para evitar essas especulações, o Palácio do Campo das Princesas mandou que o secretário se afastasse oficialmente da pasta, com um providencial pedido de férias.
Aliados em guerra

Mesmo que vença a disputa interna, o prefeito do Recife ganha musculatura e emerge como nova liderança do PT no Estado, mas a vitória pode não significar a pacificação. Um grupo de cinco partidos aliados, capitaneado pelo PTB do senador Armando Monteiro Neto, ameaça lançar candidatura alternativa, por recusar-se a marchar com João da Costa. Nos bastidores políticos locais, o que se espera é que, a partir de domingo (20), o PT não seja mais credor de tanta paciência dos partidos aliados. O chamado “grupo alternativo”, bem como outros partidos da Frente Popular, casos de PCdoB, PSB e PDT, não aceitarão mais problemas internos tumultuando o grupo. 

Nesta quinta-feira, João da Costa reclamou de terrorismo dos adversários internos.
Quem é João da Costa

Natural da cidade de Angelim, no interior do Estado, João da Costa emergiu para a vida pública vindo do movimento estudantil na Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), onde cursou administração de empresas nos idos de 1980. Depois de abandonar o curso, optou por Agronomia na Universidade Rural. Naquele tempo já integrava um movimento de esquerda conhecido por Travessia, onde conheceu o senador Humberto Costa (PT) e seu ex-secretário de Educação, Cláudio Duarte, fundadores do PT em Pernambuco. Foi através de Duarte que João da Costa assumiu seu primeiro cargo de indicação política, em 1997, como secretário-adjunto de Saúde da Prefeitura do Cabo de Santo Agostinho, à época comandada por Elias Gomes. 

Na volta ao trabalho, em janeiro de 2011, viu crescer a lista de desafetos petistas ao pôr em prática o mesmo método utilizado pelo antecessor: o de trabalhar quase que unicamente com pessoas da sua cota pessoal. Ganhou fama de centralizador e a resistência dos partidos aliados em apoiar o seu nome à reeleição, tendo o PTB à frente.

O cargo de secretário de Planejamento e Orçamento Participativo, que ocupou durante os oito anos da gestão João Paulo, ajudou o prefeito a penetrar nas bases do PT, onde é bastante festejado. É confiando nessa capilaridade junto a base que ele promete vencer a prévia de hoje.
Quem é Rands

Com uma atuação parlamentar criticada por servidores públicos e aposentados, no governo Lula, Rands afastou-se por um tempo das lideranças sindicais, mas, mesmo assim, reelegeu-se deputado em 2006 e 2010 sem dificuldades. Chegou à liderança do PT na Câmara no período do Mensalão e não titubeou na defesa do partido. A defesa rendeu-lhe crédito na cúpula petista. Em 2011, assumiu a secretaria de Governo da gestão Eduardo, a quem não poupa elogios.

Rands começou a vida como advogado da Comissão de Justiça e Paz, de dom Hélder Câmara. Foi o pontapé para uma trajetória profissional bem sucedida e originou a ligação com os movimentos populares. Passou a advogar para sindicato “sempre de trabalhadores”, como sindicatos de trabalhadores rurais e de servidores públicos. Passou em concurso para professor da Faculdade de Direito do Recife e para procurador do Recife. Amealhou um considerável patrimônio.

Na política, militou no MDB na década de 1970. Em 1987, integrou o governo Miguel Arraes em um cargo terceiro escalão, como procurador de uma autarquia estadual. Na década de 1990, foi eleito vice-presidente e conselheiro federal da OAB de Pernambuco, quando se aproximou do PT, elegendo-se deputado federal em 2002, na primeira eleição que disputou, com 107,7 mil votos.